129. Ardbeg – Wee Beastie 5 anos!!!
Whisky de malte escocês da ilha de Islay.
47,4% de teor alcoólico.
Não passou por filtragem à frio e não lhe foi adicionado corante.
Ousadia.
Em países tropicais como Brasil e Índia, um destilado envelhecido por cinco anos em barris de carvalho equivaleria a dez anos em um país frio como a Escócia.
Sim!!!
A temperatura exerce forte influência na maturação de um whisky.
A Ardbeg, de forma corajosa e inovadora, decidiu lançar um whisky turfado com “apenas” cinco anos de maturação em barril!
Não por acaso!
Quis a Ardbeg, demonstrar num rótulo, o potencial do equilíbrio entre a tenra idade de maturação e o desenvolvimento dos fenóis advindos da turfa neste whisky.
Wee Beastie! Ou, “pequena besta!”
Uma hipérbole interessante, que nos convida a discorrer um pouco sobre fenóis para entender o porquê da Ardbeg lançar um whisky com apenas cinco anos de maturação, dando ênfase num marketing ousado sobre a força da sensação turfada num whisky jovem, porém equilibrado.
Nós já escrevemos um artigo sobre a turfa (aqui).
Falaremos agora, sobre a relação turfa x nível de ppm x tempo de maturação; e como esta relação influencia diretamente o whisky que você tem aí na taça!
Sabemos que “ppm” (partes por milhão), se traduz na quantidade de tempo em que a cevada ainda úmida foi exposta à fumaça de turfa. Esta, cheia de compostos, adentram ao cereal, secando, agregando sabores e aromas, artificialmente, de acordo com o que se propõe no resultado final do destilado.
Ou seja, o nível de exposição da cevada maltada à fumaça de turfa, que com seu calor delimita seu percentual é medida em “ppm”, ou “partes por milhão”.
Quanto mais tempo a cevada recém maltada ficar exposta à fumaça de turfa, maior será sua concentração de fenóis. Maior será seu “ppm”.
Resumidamente, “ppm”, é o nível de turfa.
Um “ppm” equivale a 1 miligrama em um litro.
Esse cálculo, das partes fenólicas por milhão, na cevada, pode ser medido por espectroscopia UV ou, mais comumente, cromatografia líquida de alta eficiência (HPLC), esta mais eficiente.
Um nível de turfa de cerca de 10 ppm é considerado leve e normalmente resulta em um whisky de malte com suaves notas de fumaça.
Cerca de 25ppm é um nível médio.
Enquanto um nível de 40-50ppm é considerado fortemente turfado e geralmente produz fumaça muito mais pronunciada.
Acima de 50 ppm podem ser considerados verdadeiras bombas de turfa! Não necessariamente super enfumaçados, mas com toda certeza, riquíssimos em aromas e sabores.
O nível de “ppm” é medido sobre a cevada defumada, ainda em grãos. Não é medido sobre o produto pronto para ser engarrafado.
Até essa cevada tornar-se whisky, o caminho é longo! Ao menos três anos na Escócia. Dois anos no Brasil. Por exemplo.
Em todas as fases do processo de produção há indiscutível degradação do nível de “ppm” inicial.
Mas é digno de menção a importância do corte na destilação e o tempo de maturação/influência do barril.
Sobre a destilação, a divisão: cabeça, coração e rabo; quanto menor for o coração, mais leve em fenóis será o destilado. Quanto mais se adentra à cabeça ou ao rabo, maior os tipos de fenóis disponíveis. Claro, tendo o cuidado de não deixar passar compostos alcoólicos indesejáveis.
Em relação à maturação, a oxidação e a evaporação no decorrer do tempo em barril, ativa e faz desaparecer vários tipos de fenóis. Certo é que eles diminuem com o passar do tempo. Além claro de atingir seu pico também com o decorrer do tempo.
Interessante dizer também que um barril de segundo ou terceiro uso facilitará o desenvolvimento dos fenóis, porque a menor interação com a madeira deixará um maior equilíbrio, amenizando os fenóis da própria madeira, deixando os fenóis da cevada turfada mais livres para se desenvolver.
Cabe ao master blender saber a hora certa de engarrafar o destilado que se está envelhecendo, de acordo com o perfil escolhido para aquele whisky.
Aqui encontramos nossa deixa para voltar a falar sobre o Ardbeg Wee Beastie, com cinco anos de maturação.
A Ardbeg deu a entender que com cinco anos, “a besta” atingiu seu auge!! Claro, limitado ao nível de “ppm” medido lá atrás após a defumação.
Como dissemos anteriormente: são várias variáveis! O nível de ppm não concretiza um whisky mais enfumaçado.
Ao contrário do que muitos pensam, no “new make” da cevada turvada (quase), não há percepção de turfa!
Sim.
Tivemos a oportunidade, em Islay, de degustar vários “spirits”, de várias destilarias da ilha famosa por seus whiskies turfados (onde o whisky escocês nasceu), e constatamos que no “new make”, pouco ou quase nada de turfa é detectado.
Independente do nível de “ppm”, é necessário um espaço de tempo em repouso para o destilado “abrir” seu potencial fenólico (ficou até erótico isso!!!).
Mais do que isso, a Ardbeg quis demonstrar que mesmo no auge da ativação de fenóis, seu whisky, bastante jovem, consegue o equilíbrio necessário para agradar amantes de whiskies defumados, sendo a turfa bem expressiva, mas delimitada pelo seu nível de “ppm” (Vide “Octomore”. Alguns também possuem apenas 5 anos de maturação, mas a sensação de turfa é muito maior devido ao nível de “ppm” superior).
Mas sim, foi missão cumprida para a Ardbeg!
Com 5 anos de maturação, começou sua jornada com generosos 50 a 55 de “ppm”!
Foi maturado numa mescla de barris de carvalho americano ex Bourbon e, diferente do dez anos, uma parte do whisky também maturou em barris europeus que antes contiveram vinho Jerez Oloroso. Provavelmente todos os barris ou a grande maioria, barris de refil.
Na taça se apresentou bastante oleoso. Lágrimas estreitas escorreram de forma rápida, permanecendo respingos por todo bojo que vão escoando devagar.
Possui uma coloração dourado claro.
No aroma, notas de maresia com muito enfumaçado e discreto cítrico. Um aroma de fermento também é sentido (como em outros rótulos da mesma destilaria).
Na boca é doce, bem enfumaçado e bem apimentado.
Baunilha, herbal, cítrico e amadeirado.
A finalização é longa! Enfumaçado muito agradável! Com notas cítricas e amadeiradas de fundo.
Mas ficou a sensação de que deveria haver mais fumaça aqui!!!
Com a taça esvaziada, enfumaçado doce.
Podemos dizer com toda certeza, é um whisky jovem e mesmo assim, equilibrado.
Os barris ex Jerez são bem tímidos e apenas serviram para distanciar um pouco o perfil deste whisky em relação ao clássico dez anos. Pouco influenciaram para causar algum impacto.
Colocamos lado a lado com o clássico Ardbeg 10 anos e este ainda, para nós, é um whisky melhor. Mais rico, mais frutado (casca de laranja), e com mais sensação de fumaça. Com uma finalização também mais enfumaçada.
E claro, nossa memória afetiva coloca o 10 anos de Ardbeg como um dos melhores whiskies por nós degustados. E somos grandes fãs de whiskies turfados!
A experiência foi boa! Mas fermentação, destilação e maturação influenciam, e muito, o resultado final do destilado. Talvez o nome lhe seja realmente muito apropriado: “Uma pequena besta”!
Mas lembramos que ele está alocado entre grandes bestas da mesma ótima destilaria de Islay.
Saúde!!!
2 comentários
1 menção
Excelente explanação.
Autor
Muito obrigado, amigo!!!
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