Como degustar whisky???

Em primeiro lugar precisamos deixar uma coisa bem clara: o whisky é seu. Você tem o direito de degustá-lo da maneira que quiser.

Ok.

Mas se você realmente deseja extrair tudo que a melhor bebida do mundo pode te oferecer, alguns detalhes devem ser observados.

Degustar whisky é, acima de tudo, um prazer. Seja sozinho, organizando seu “eu” interior; num grupo animado de amigos ou mesmo com aquela pessoa especial, tenha em mente: não tenha pressa!!

Pense no whisky colocado à sua frente como um livro, leia-o, interprete-o.

De forma simples, sem complicar.

Devido à seu processo de fabricação ser complexo, o whisky também é uma bebida complexa, rica.

Passível de ser interpretada de forma personalíssima. O whisky te remete a lembranças sensoriais.

Você, sentindo o aroma de um whisky, pode ser levado a lembrar do cheiro do banco de couro do carro do seu pai, ou mesmo do cheiro de biscoito de nata quentinho que sua avó fazia pra você na infância.

E relembrar coisas queridas é sempre muito bom!

Tente sempre simplificar uma sensação. Se você sentir cheiro de grama, não pense em “relva recém cortada por mulheres virgens da Nova Zelândia”. Atenha-se ao fato principal: cheiro de grama cortada.

Ou se você nota uma presença salina no aroma, não precisa identificar como “cheiro de salinas do litoral sul do Rio Grande do Norte”. Diga apenas: cheiro de sal.

Sempre a interpretação mais simples e honesta, é a melhor interpretação.

Taça ideal é aquela que se estreita do bojo à borda. Ela retém os aromas e obviamente deve ser transparente.

Uma boa taça enriquece a experiência.

Numa degustação se avalia quatro coisas: cor, olfato, sabor e finalização.

Comece pelo visual. Incline um pouco a taça e gire, molhando as laterais internas. Volte a taça para a posição normal e verifique acima da linha do whisky, as chamadas pernas ou lágrimas, escorrendo pela tacinha.

Se escorrerem rápidas e próximas uma das outras, é indício que o destilado é novo. Se escorrerem devagar e separadas, o whisky foi melhor envelhecido. Possui melhor estrutura, maior teor alcoólico.

Em seguida, coloque a taça contra a luz, uma folha de papel branco ou uma parede branca. Observe a cor da bebida. Infelizmente, algumas destilarias e alguns engarrafadores usam corante caramelo (E150A), para homogeneizar a cor de seus produtos. Esse corante em altas doses é amargo, mas nos níveis da indústria do whisky é inofensivo em sabor. Apenas muda a cor para homogeneizar a produção.

Se não há corante, a cor do whisky diz muito sobre a sua maturação em barril.

Cor de cobre fechado, avermelhado ou cor de laranja são indícios de que o destilado amadureceu em barris que antes contiveram algum tipo de vinho, herdando características bem específicas como taninos, aromas e sabores.

Da mesma forma, se a coloração do whisky puxar para o cobre claro, dourado mais opaco ou amarelo palha, é provável que os tonéis foram usados antes para maturar Bourbon.

Os Bourbons, por sua vez, e por Lei, devem ser envelhecidos em barris virgens, porém crestados (queimados), por dentro. O carvão interno, em contato com o espírito (o destilado novo), carameliza, passando sabores, aromas e cores à bebida.

As várias variáveis variam de acordo com o tipo de barril usado na maturação do whisky, seja barril ex Bourbon e ex Xerez (ou Jerez, ou Sherry), bem como barris ex Rum, ex Conhaque, ex cerveja, e por aí vai! Cada tipo de barril possui sua própria gama de aromas e sabores. A alquimia é infinita!

Voltando à degustação após análise visual, cheire o whisky.

Mova a taça abaixo do nariz, de um lado ao outro, devagar, depois coloque o nariz dentro da tacinha, para que possa sentir os aromas que se desprendem do destilado.


Algumas gotas de água mineral, pura, sem gás, na temperatura ambiente, são benéficas pois rompem a camada oleosa de cima do destilado, revelando novos aromas sutis que estavam retidos. O uso de uma tampinha em cima da taça pode facilitar a retenção e análise. Essa tampinha é usada principalmente numa degustação onde haverá prova de várias amostras. Assim evita-se a evaporação e perda dos aromas pela demora das análises de cada amostra.

Sobre acrescentar gotas de água na degustação… Bom, a maioria dos autores recomendam pelos motivos acima expostos. De minha parte prefiro não acrescentar. Gosto de sentir os aromas e sabores de acordo como foi proposto pela destilaria e seus profissionais para aquele whisky em questão.

Continuando a degustação…

Agora a melhor parte, beba!!!

Sorva um pequeno gole e mova a bebida por toda a boca, mastigando o líquido, deixando passar pela língua e céu da boca.

Sinta a consistência. É encorpado? É leve? Tá queimando? Engula e beba mais um gole.

A “sensação bucal” é a parte mais importante. Está intimamente ligada à fase de produção, desde como se escolheu o tipo de grão, como se moeu esse grão, o tipo de secagem do grão maltado, a escolha da levedura, a separação do espírito na destilação (cabeça, coração e rabo), e enfim, a maturação (tipo de madeira e bebida antes contida).

Mas concentre-se na bebida em sua boca!! Não se distraia!!

O que o sabor te lembra? O que você relaciona com esse gosto?

Ameixa, uva passa, vinho, abacaxi, maracujá, laranja, limão, coco, baunilha, chocolate, madeira, tabaco, bacon, fumaça, iodo, sal, açúcar, mel, terra ?!?!??

Lembre-se, é a bebida mais rica de sabor do mundo!

Por fim e não menos importante, o final, o RETROGOSTO. Sinta o sabor e o tempo que o gosto permanece na boca após o whisky ser ingerido. Novos sabores podem aparecer com a salivação. A duração do retrogosto não tem nada a ver com a qualidade da bebida. É apenas uma característica.

Alguns degustadores voltam à taça vazia após 15 ou 20 minutos e sentem os aromas residuais. Fiz questão de criar esse hábito e acho muito interessante; e mesmo em alguns casos até bastante surpreendente o que a taça vazia nos revela sobre o que passou por ali.

Não deixa também de ser um treinamento. Mais uma faceta da complexidade do whisky.

Quanto mais você degustar, mais você aguçará seus sentidos. Dessa forma, aromas e sabores ficarão, com o tempo e treino, comuns. Familiares.

Grandes degustadores, master blenders famosos, que tendem a experimentar dezenas de whiskies no mesmo dia, por razões óbvias, apenas pelo cheiro escolhem os whiskies que precisam.

Existe uma correlação entre degustação e a cultura do whisky. Cultura aqui, como aquele conjunto de valores, de conhecimentos, de tradições e costumes característicos de um grupo em volta de um assunto específico. O grupo somos nós, os apaixonados por whisky.

Essa correlação deve ser sempre complementativa. Jamais eliminativa!!!

Se você começou a degustar blends, passou a degustar single malts e vai evoluindo, você evolui também seu paladar. Isso é muito bom!

Ocorre que você não precisa esnobar os whiskies que ficaram pelo seu caminho de aprendizagem. Muito menos definir um parâmetro de preço para estabelecer os whiskies que você deve beber e os whiskies que você não deve beber ou comprar!

Fazendo isso, além de você demonstrar que é um idiota esnobe, você está perdendo a oportunidade de degustar whiskies incríveis, lançados muitas vezes como um NAS (no age statement), que fugiria ao patamar inventado.

Se você faz isso ou pior, se você divulga isso, você só faz mal à cultura do whisky.

Amigo leitor, se você hoje tem paladar para beber um Highland Park 25 anos e visitando um amigo ele te oferece de bom grado, um Glenfiddich NAS que ele comprou no Aeroporto, aceite, agradeça, beba e se possível, repita!!!

Convenhamos, né?! Acho que não será um sacrifício!!!

A cultura do whisky deve ser de incentivo, de união, de respeito ao whisky e de respeito aos degustadores de whisky.

O verdadeiro degustador não está interessado em brigas entre influenciadores na internet. Picareta ou opressor existe em qualquer área. Precisam de polêmica e ataques para disfarçar falta de conhecimento. Cabe ao degustador a decisão de seguir ou não esse tipo de gente má educada que só faz mal à cultura do whisky.

Ao bom degustador, seja honesto com o whisky e ele te recompensará. Talvez ser neutro e se manter um pouco afastado realmente seja a melhor opção.

Slainté!!!

  • Artigo atualizado em 09 de julho de 2022.